O homem do senso comum vive imerso em seus afazeres quotidianos, sua vida e eminentemente utilitarista, na medida em que vive a partir de um senso imediatista do mundo. É um homem que vive num período de uma educação mercantilista e tecnicista cujo único objectivo e preparar os jovens como mão-de-obra para o mercado de trabalho. É um homem que vive num mundo utilitarista, pragmático onde o material ocupa todas as instâncias colocando o subjectivo na periferia. Isto é, as tarefas quotidianas do conforto material do trabalho, de casa e até mesmo o entretenimento e o divertimento impedem que homem comum dedique-se a uma reflexão mais profunda sobre a sua existência, reflexão que poderia aproxima-lo mesmo que de uma forma bastante superficial da filosofia.
É neste sentido que dogmatismo na vida deste homem está fortemente enraizado devido a sua relação prática e utilitarista com o mundo que não permite uma abertura a reflexão filosófica. Para ele, tudo deve possuir um sentido e uma utilidade, e se tal sentido e utilidade já se encontram como “dados” por isso não faz nenhuma reflexão crítica sobre o fundamento da realidade ou da constituição do mundo.
Assim o homem do senso comum, absorvido pelas suas actividades quotidianas no trabalho e na relação familiar, não vê nenhum propósito na exploração da essência do mundo porque isso já se manifesta como algo definido para ele. Mas o perigo e o mal disso tudo não só constrói um dogmatismo no sujeito, como acaba por determinar toda uma história de vida, do modo de ser de um sujeito no mundo. A sua compreensão do mundo, o seu posicionamento ético, o seu comportamento, os seus medos, os seus preconceitos, as suas decisões, tudo que envolve a sua existência acaba por ser determinada a partir do seu posicionamento dogmático. Ou seja, o dogmatismo uma vez enraizado aprisiona o espírito no senso comum de tal forma, que se torna uma tarefa muito difícil desconstrui-lo. O dogmatismo forma desde a infância, uma base muito forte, na qual o sujeito deposita todas as suas forcas, romper com esta base significa em última instância um exercício perigoso na medida em que a compreensão de mundo ficará suspensa por tempo indeterminado e a realidade irá mudar completamente, colocando o indivíduo na angústia da sua própria existência.
Assim, a ruptura com o dogmatismo é elemento chave para o filosofar, elemento sem o qual a própria filosofia não se move. Esta emancipação exigirá do homem imerso no dogmatismo, em primeiro lugar, um afastamento do mundo prático.
Portanto, a filosofia como demonstramos anteriormente e a única capaz de causar a ruptura do homem do senso comum com o seu dogmatismo. Tal conquista exige do indivíduo uma ruptura com as instâncias dogmáticas, que o impedem de evoluir intelectualmente rumo a um processo emancipadores, de libertação de nossas crenças e limitações.
Entendemos que esta abertura a filosofia, manifesta-se como algo intimamente existencialista, na medida em que o indivíduo, movido por motivações de ordem pessoal, conduzido pela admiração, pela dúvida, pela revolta ou pela insatisfação moral, questiona a totalidade dos fundamentos da realidade visando a ruptura com uma espécie de “dogmatismo natural” que impede a compreensão clara e objectiva dos factos a sua volta.
Por “realidade” entende-se não somente a existência material ou subjectiva do sujeito no mundo, mas todo o contexto cultural, politico e ideológico que o cerca, o funcionamento das estruturas de poder e de dominação que se manifestam na sociedade contemporânea. O reconhecimento desta realidade se da mediante a ruptura com o dogmatismo, através da actividade do filosofar. A conquista do filosofar por sua vez e existencialista na medida em que o indivíduo absorvido pelos próprios questionamentos sobre o “véu” que esconde esta realidade resolve romper por iniciativa própria com o seu dogmatismo, quebrando as cadeias de pensamentos triviais do senso comum.
Uma vez que sejam quebradas estas cadeias e o dogmatismo seja rejeitado, o homem comum suspende todos os seus juízos, sendo que a sua compreensão de mundo acaba por vacilar, deslocando o indivíduo do seu prumo de centro e o afastando da realidade pragmática do mundo. Este afastamento do mundo incide em um problema serio que pode desembocar na adopção de uma posição céptica ou niilista. Para que o indivíduo não se perca neste percurso e necessário o seu retorno ao mundo, só que desta vez, o “mundo” possuirá um significado diferente do que possuía para o dogmático anteriormente, pois uma vez que tenha conquistado o “filosofar”, sua concepção de mundo passa a ser eminentemente filosófica.
Gaby Lomengo
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